sexta-feira, 11 de julho de 2008

O sacrifício da Aurora - Vinicius de Moraes


Um dia a Aurora chegou-se 

Ao meu quarto de marfim 

E com seu riso mais doce 

Deitou-se junto de mim 

Beijei-lhe a boca orvalhada 

E a carne não tinha sangue 

A boca sabia a nada.

Apaixonei-me da Aurora 

No meu quarto de marfim 

Todo o dia à mesma hora

Amava-a só para mim 

Palavras que me dizia 

Transfiguravam-se em neve 

Era-lhe o peso tão leve

Era-lhe a mão tão macia.

Às vezes me adormecia 

No meu quarto de marfim

Para acordar, outro dia 

Com a Aurora longe de mim 

Meu desespero covarde 

Levava-me dia afora 

Andando em busca da Aurora 

Sem ver Manhã, sem ver Tarde.

Hoje, ai de mim, de cansado, 

Há dias que até da vida 

Durmo com a Noite, ausentado 

Da minha Aurora esquecida… 



É que apesar de sombria 

Prefiro essa grande louca 

À Aurora, que além de pouca 

É fria, meu Deus, é fria!

Vinicius de Moraes

Um comentário:

Maria José Silva disse...

Sim...
Adorei.
Vim pela poesia e a imagem.
Gostei do que li e vi;.