Mostrando postagens com marcador Jose Luis Peixoto. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Jose Luis Peixoto. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Lembro-me bem do seu olhar - Jose L. Peixoto

Lembro-me bem do seu olhar.
Ele atravessa ainda a minha alma,
Como um risco de fogo na noite.

Lembro-me bem do seu olhar. 

O resto…
Sim o resto parece-se apenas com a vida.

Ontem, passei nas ruas como qualquer pessoa.

Olhei para as montras despreocupadamente e não encontrei amigos com quem falar.

De repente vi que estava triste, mortalmente triste, tão triste que me pareceu que me seria impossível viver amanhã, não porque morresse ou me matasse, mas porque seria impossível viver amanhã e mais nada.

Fumo, sonho, recostado na poltrona.
Dói-me viver como uma posição incómoda.

Deve haver ilhas lá para o sul das coisas onde sofrer seja uma coisa mais suave, onde viver custe menos ao pensamento, e onde a gente possa fechar os olhos e adormecer ao sol e acordar sem ter que pensar em responsabilidades sociais nem no dia do mês ou da semana que é hoje.

Abrigo no peito, como a um inimigo que temo ofender, um coração exageradamente espontâneo, que sente tudo o que eu sonho como se fosse real, que bate com o pé a melodia das canções que o meu pensamento canta, canções tristes, como as ruas estreitas quando chove

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Eras tu a Claridade - Jose L. Peixoto

O tempo, subitamente solto pelas ruas e pelos dias, como a onda de uma tempestade a arrastar o mundo, mostra-me o quanto te amei antes de te conhecer.

Eram os teus olhos, labirintos de água, terra, fogo, ar, que eu amava quando imaginava que amava. 

Era a tua a tua voz que dizia as palavras da vida. 

Era o teu rosto. Era a tua pele. Antes de te conhecer, existias nas árvores e nos montes e nas nuvens que olhava ao fim da tarde.

Muito longe de mim, dentro de mim, eras tu a claridade.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

A mulher mais bonita do mundo - Jose L. Peixoto

Estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram flores novas na terra do jardim, quero dizer que estás bonita.

Entro na casa, entro no quarto, abro o armário, abro a gaveta, abro a caixa onde está o teu fio de ouro.

Entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como se tocasse a pele do teu pescoço.

Há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim. estás tão bonita hoje. os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

Estás dentro de algo que está dentro de todas as coisas, a minha voz nomeia-te para descrever a beleza. os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

De encontro ao silêncio, dentro do mundo, estás tão bonita é aquilo que quero dizer”


José Luís Peixoto
 in ”A Casa, a Escuridão”

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Explicação da Eternidade - Jose L. Peixoto

Devagar, o tempo transforma tudo em tempo.

O ódio transforma-se em tempo,
o amor transforma-se em tempo,
a dor transforma-se em tempo.

Os assuntos que julgamos mais profundos, mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis,
transformam-se devagar em tempo.

Por si só, o tempo não é nada.

A idade de nada é nada.

A eternidade não existe.

No entanto, a eternidade existe.

Os instantes dos teus olhos parados sobre mim eram eternos.

Os instantes do teu sorriso eram eternos.

Os instantes do teu corpo de luz eram eternos.

Foste eterna até ao fim.



José Luís Peixoto, 
in “A Casa, A Escuridão”