sexta-feira, 10 de março de 2017

Noite - Cecilia Meireles

Úmido gosto de terra,
cheiro de pedra lavada
tempo inseguro do tempo!
sombra do flanco da serra,
nua e fria, sem mais nada.

Brilho de areias pisadas,
sabor de folhas mordidas,
lábio da voz sem ventura!
suspiro das madrugadas
sem coisas acontecidas.

A noite abria a frescura
dos campos todos molhados,
sozinha, com o seu perfume!
preparando a flor mais pura
com ares de todos os lados.

Bem que a vida estava quieta.

Mas passava o pensamento...
de onde vinha aquela música?

E era uma nuvem repleta,
entre as estrelas e o vento.



Cecília Meireles
poesia do livro "Viagem" de 1938

Um comentário:

Daniela disse...

Que magia esse poema de Cecília Meireles traz! Suavidade, sonho, pureza. Imagino uma vida serena, simples, cheia de amor! Linda a imagem!