domingo, 30 de agosto de 2020

Requiescat - Olavo Bilac

Por que me vens, com o mesmo riso, 
Por que me vens, com a mesma voz, 
Lembrar aquele Paraíso, 
Extinto para nós? 

Por que levantas esta lousa? 
Por que, entre as sombras funerais, 
Vens acordar o que repousa, 
O que não vive mais? 

Ah! esqueçamos, esqueçamos 
Que foste minha e que fui teu: 
Não lembres mais que nos amamos, 
Que o nosso amor morreu! 

O amor é uma árvore ampla, e rica 
De frutos de ouro, e de embriaguez: 
Infelizmente, frutifica 
Apenas uma vez... 

Sob essas ramas perfumadas, 
Teus beijos todos eram meus: 
E as nossas almas abraçadas 
Fugiam para Deus. 

Mas os teus beijos esfriaram. 
Lembra-te bem! lembra-te bem! 
E as folhas pálidas murcharam, 
E o nosso amor também. 

Ah! frutos de ouro, que colhemos, 
Frutos da cálida estação, 
Com que delícia vos mordemos, 
Com que sofreguidão! 

Lembras-te? os frutos eram doces... 
Se ainda os pudéssemos provar! 
Se eu fosse teu... se minha fosses, 
E eu te pudesse amar... 

Em vão, porém, me beijas, louca! 
Teu beijo, a palpitar e a arder, 
Não achará, na minha boca, 
Outro para o acolher. 

Não há mais beijos, nem mais pranto! 
Lembras-te? quando te perdi 
Beijei-te tanto, chorei tanto, 
Com tanto amor por ti, 

Que os olhos, vês? já tenho enxutos, 
E a minha boca se cansou: 
A árvore já não tem mais frutos! 
Adeus! tudo acabou! 

Outras paixões, outras idades! 
Sejam os nossos corações 
Dois relicários de saudades 
E de recordações. 

Ah! esqueçamos, esqueçamos! 
Durma tranqüilo o nosso amor 
Na cova rasa onde o enterramos 
Entre os rosais em flor... 

Olavo Bilac, in "Poesias"

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