sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Erupção - Anais Nin


O ímpeto de crescer e viver intensamente,
foi tão forte em mim, que não consegui resistir a ele.
Enfrentei meus sentimentos.
A vida não é racional!
É louca e cheia de mágoa.

Mas não quero viver comigo mesma.
Quero paixão, prazer, barulho, 
bebedeira, e todo o mal.

Quero ouvir música rouca, 
ver rostos, roçar em corpos,
beber um Benedictine ardente.
Quero conhecer pessoas perversas, 
ser íntima delas.

Quero morder a vida, 
e ser despedaçada por ela.

Eu estava esperando.
Esta é a hora da expansão, 
do viver verdadeiro.

Todo o resto foi uma preparação.
A verdade é que sou inconstante,
com estímulos sensuais em muitas direções.

Fiquei docemente adormecida por alguns séculos,
e entrei em erupção sem avisar.

Anais Nin

domingo, 31 de julho de 2016

Vivem em nós inúmeros - Fernando Pessoa

Vivem em nós inúmeros;

Se penso ou sinto, ignoro

Quem é que pensa ou sente.

Sou somente o lugar
Onde se sente ou pensa.

Tenho mais almas que uma.
Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.

Os impulsos cruzados
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu ’screvo.


Fernando Pessoa 
como Ricardo Reis em 13/11/1935
Esta poesia inspira o Prince Cristal.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Rifa-se um coração - Clarisse Lispector

Rifa-se um coração quase novo.
Um coração idealista.
Um coração como poucos. 
Um coração à moda antiga. 
Um coração moleque que insiste em pregar peças no seu usuário. 

Rifa-se um coração que na realidade está um pouco usado, meio calejado, muito machucado e que teima em alimentar sonhos e, cultivar ilusões. 
Um pouco inconseqüente que nunca desiste de acreditar nas pessoas. 
Um leviano e precipitado coração que acha que Tim Maia estava certo quando escreveu... "...não quero dinheiro, eu quero amor sincero, é isso que eu espero...". 
Um idealista... 
Um verdadeiro sonhador... 

Rifa-se um coração que nunca aprende. 
Que não endurece, e mantém sempre viva a esperança de ser feliz, sendo simples e natural. 
Um coração insensato que comanda o racional sendo louco o suficiente para se apaixonar. 
Um furioso suicida que vive procurando relações e emoções verdadeiras. 

Rifa-se um coração que insiste em cometer sempre os mesmos erros. 
Esse coração que erra, briga, se expõe. 
Perde o juízo por completo em nome de causas e paixões. 
Sai do sério e, às vezes revê suas posições arrependido de palavras e gestos. 
Este coração tantas vezes incompreendido. 
Tantas vezes provocado. 
Tantas vezes impulsivo. 

Rifa-se este desequilibrado emocional que abre sorrisos tão largos que quase dá pra engolir as orelhas, mas que também arranca lágrimas e faz murchar o rosto. 
Um coração para ser alugado, ou mesmo utilizado por quem gosta de emoções fortes. 
Um órgão abestado indicado apenas para quem quer viver intensamente, contra indicado para os que apenas pretendem passar pela vida matando o tempo, defendendo-se das emoções. 

Rifa-se um coração tão inocente que se mostra sem armaduras e deixa louco o seu usuário. 
Um coração que quando parar de bater ouvirá o seu usuário dizer para São Pedro na hora da prestação de contas: 

"O Senhor pode conferir. Eu fiz tudo certo, só errei quando coloquei sentimento. Só fiz bobagens e me dei mal quando ouvi este louco coração de criança que insiste em não endurecer e, se recusa a envelhecer" 

Rifa-se um coração, ou mesmo troca-se por outro que tenha um pouco mais de juízo. 
Um órgão mais fiel ao seu usuário. 
Um amigo do peito que não maltrate tanto o ser que o abriga. 
Um coração que não seja tão inconsequente. 

Rifa-se um coração cego, surdo e mudo, mas que incomoda um bocado. 
Um verdadeiro caçador de aventuras que ainda não foi adotado, provavelmente, por se recusar a cultivar ares selvagens ou racionais, por não querer perder o estilo. 
Oferece-se um coração vadio, sem raça, sem pedigree. 

Um simples coração humano. 
Um impulsivo membro de comportamento até meio ultrapassado. 
Um modelo cheio de defeitos que, mesmo estando fora do mercado, faz questão de não se modernizar, mas vez por outra, constrange o corpo que o domina. 
Um velho coração que convence seu usuário a publicar seus segredos e a ter a petulância de se aventurar como poeta.



Texto de Clarice Lispector,
arranjado em forma de poema pelo padre Antônio Damásio

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Entre o Sono e Sonho - Fernando Pessoa

Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.

Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.

Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.

E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre
Esse rio sem fim. 

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro [1935]

Em meio a tanta mediocridade que vemos na internet achei esta preciosidade.
Uma carta de Fernando Pessoa ao amigo Adolfo Monteiro de 1935.
Recomendo ler e entender a obra preciosa de Pessoa.


Carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro sobre a Gênese dos Heterônimos
Caixa Postal 147

Lisboa, 13 de Janeiro de 1935

Meu prezado Camarada,

Muito lhe agradeço a sua carta, a que vou responder imediatamente e integralmente. Antes de, propriamente, começar, quero pedir-lhe desculpa de lhe escrever neste papel de cópia. Acabou-se-me o decente, é domingo, e não posso arranjar outro. Mas mais vale, creio, o mau papel que o adiamento.

Em primeiro lugar, quero dizer-lhe que nunca eu veria «outras razões» em qualquer coisa que escrevesse, discordando, a meu respeito, sou um dos poucos poetas portugueses que não decretou a
sua própria infalibilidade, nem toma qualquer crítica que se lhe faça, como um acto de lesa-divindade.

Além disso, quaisquer que sejam os meus defeitos mentais, é nula em mim a tendência para a mania da perseguição. Á parte isso, conheço já suficientemente a sua independência mental, que, se me é permitido dizê-lo, muito aprovo e louvo. Nunca me propus ser Mestre ou Chefe – Mestre, porque não sei ensinar, nem sei se teria que ensinar; Chefe, porque não sei estrelar ovos. Não se preocupe, pois, em qualquer ocasião, com o que tenha de dizer a meu respeito. Não procuro caves nos andares nobres.

Concordo absolutamente consigo em que não foi feliz a estreia, que de mim mesmo fiz com um livro de natureza da Mensagem. Sou, de facto, um nacionalista místico, um sebastianista racional. Mas sou, à parte isso, e até em contradição com isso, muitas outras coisas. E essas coisas, pela mesma natureza do livro, a Mensagem não as inclui.

Comecei por esse livro as minhas publicações pela simples razão de que foi o primeiro livro que consegui, não sei porquê, ter organizado e pronto. Como estava pronto, devo dizer, com os olhos postos no prémio do Secretariado, embora nisso não houvesse pecado intelectual de maior. O meu livro estava pronto em Setembro, e eu julgava, até, que não poderia concorrer ao prémio, pois ignorava que o prazo para a entrega dos livros, que primitivamente fora até ao fim de Julho, fora alargado até ao fim de Outubro. Como, porém, em fim de Outubro já havia exemplares da Mensagem, fiz entrega dos que o Secretariado exigia. O livro estava exactamente nas condições (nacionalismo) de concorrer. Concorri.

Quando ás vezes pensava na ordem de uma futura publicação de obras minhas, nunca um livro do género de Mensagem figurava em número um. Hesitava entre se deveria começar por um livro de versos grandes – um livros de umas 350 páginas -, englobando as diversas subpersonalidades de Fernando Pessoa ele mesmo, ou se deveria abrir com uma novela policiaria, que ainda não consegui completar.

Concordo consigo, disse, em que não foi feliz a estreia, que de mim mesmo fiz com a publicação da Mensagem. Mas concordo com os factos que foi a melhor estreia que eu poderia fazer. Precisamente porque esta faceta – em certo modo secundária – da minha personalidade não tinha nunca sido suficientemente manifestada nas minhas colaborações em revistas (excepto no caso do Mar Português,parte deste mesmo livro) – precisamente por isso convinha que ela aparecesse, e que aparecesse agora.

Coincidiu, sem que eu o planeasse ou o premeditasse (sou incapaz de premeditação prática), com um dos momentos críticos (no sentido original da palavra) da remodelação do subconsciente nacional. O que fiz por acaso e se completou por conversa, fora exactamente talhado, com a Esquadria e o Compasso, pelo Grande Arquitecto.

(Interrompo. Não estou doido nem bêbado. Estou, porém, escrevendo directamente, tão depressa quanto a máquina mo permite, e vou-me servindo das expressões que me ocorrem, sem olhar a que literatura haja nelas. Suponha – e fará bem em supor, porque é verdade – que estou simplesmente falando consigo.)

Respondo agora directamente às suas três perguntas: (1) Plano futuro da publicação das minhas obras, (2) génese dos meus heterónimos, e (3) ocultismo.

Feita, nas condições que lhe indiquei, a publicação da Mensagem, que é uma manifestação unilateral, tenciono prosseguir da seguinte maneira. Estou agora completando uma versão totalmente
remodelada do Banqueiro Anarquista; essa deve estar pronta em breve e conto, desde que esteja pronta, publicá-la imediatamente. Se assim fizer, traduzo imediatamente este escrito para inglês, e vou ver se o posso publicar em Inglaterra. Tal qual deve ficar, tem probabilidades europeias. (Não tome este frase no sentido de Prémio Nobel imanente.) Depois – e agora respondo propriamente à sua pergunta, que se reporta a poesia – tenciono, durante o Verão, reunir o tal grande volume dos poemas pequenos do Fernando Pessoa ele mesmo, e ver se o consigo publicar em fins do ano em que estamos. 

Será esse o volume que o Casais Monteiro espera, e é esse que eu mesmo desejo que se faça. Esse, então, será as facetas todas, excepto a nacionalista, que a Mensagem já manifestou.

Referi-me, como viu, ao Fernando Pessoa só. Não penso nada do Caeiro, do Ricardo Reis ou do Álvaro de Campos. Nada disso poderei fazer, no sentido de publicar, excepto quando (ver mais acima) me for dado o Prémio Nobel. E contudo – penso-o com tristeza – pus no Caeiro todo o meu poder de despersonalização dramática, pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental vestida de música que lhe é própria, pus em Álvaro de Campos toda a emoção que não dou nem a mim nem à vida. Pensar, meu querido Casais Monteiro, que todos estes têm que ser, na prática da publicação, preteridos pelo Fernando Pessoa, impuro e simples! Creio que respondi à sua primeira pergunta.

Se fui omisso, diga em quê. Se puder responder, responderei. Mais planos não tenho, por enquanto. E, sabendo eu o que são e em que dão os meus planos, é caso para dizer, Graças a Deus!

Passo agora a responder à sua pergunta sobre a génese dos meus heterónimos. Vou ver se consigo responder-lhe completamente.

Começo pela parte psiquiátrica. A origem dos meus heterónimos é o fundo traço de histeria que existe em mim. Não sei se sou simplesmente histérico, se sou, mais propriamente, um histeroneurasténico. Tendo para esta segunda hipótese, porque há em mim fenómenos de abulia que a histeria, propriamente dita, não enquadra no registo dos seus sintomas. Seja como for, a origem mental dos meus heterónimos está na minha tendência orgânica e constante para a despersonalização e para a simulação. Estes fenómenos – felizmente para mim e para os outros – mentalizaram-se em mim; quero dizer, não se manifestam na minha vida prática, exterior e de contacto com os outros; fazem explosão para dentro e vivo-os eu a sós comigo. Se eu fosse mulher – na mulher os fenómenos histéricos rompem em ataques e coisas parecidas – cada poema de Álvaro de Campos (o mais histericamente histérico de mim) seria um alarme para a vizinhança. Mas sou homem – e nos homens a histeria assume principalmente aspectos mentais; assim tudo acaba em silêncio e poesia…

Isto explica, tant bien que mal, a origem orgânica do meu heteronimismo. 

Vou agora fazer-lhe a história directa dos meus heterónimos. Começo por aqueles que morreram, e de alguns dos quais já não me lembro – os que jazem perdidos no passado remoto da minha infância quase esquecida.

Desde criança, tive a tendência para criar em meu torno um mundo fictício, de me cercar de amigos e conhecidos que nunca existiram. (Não sei, bem entendido, se realmente não existiram, ou se sou eu que não existo. Nestas coisas, como em todas, não devemos ser dogmáticos.) Desde que me conheço como sendo aquilo a que chamo eu, me lembro de precisar mentalmente, em figura, movimentos, carácter e história, várias figuras irreais que eram para mim tão visíveis e minhas como as coisas daquilo a que chamamos, porventura abusivamente, a vida real. Esta tendência, que me vem desde que me lembro de ser um eu, tem-me acompanhado sempre, mudando um pouco o tipo de música com que me encanta, mas não alterando nunca a sua maneira de encantar.

Lembro, assim, o que me parece ter sido o meu primeiro heterónimo, ou antes, o meu primeiro conhecido inexistente – um certo Chavalier de Pas dos meus seis anos, por quem escrevia cartas dele a mim mesmo, e cuja figura, não inteiramente vaga, ainda conquista aquela parte da minha afeição que confina com a saudade. Lembro-me, com menos nitidez, de uma outra figura, cujo nome já não me ocorre mas que o tinha estrangeiro também, que era não sei quê, um rival do Chevalier de Pas… Coisas que acontecem a todas as crianças? Sem dúvida – ou talvez. Mas a tal ponto as vivi que as vivo ainda, pois que as relembro de tal modo que é mister um esforço para me fazer saber que não foram realidades.

Esta tendência para criar em torno de mim um outro mundo, igual a este mas com outra gente, nunca me saiu da imaginação. Teve várias fases, entre as quais esta, sucedida já em maioridade.

Ocorria-me um dito de espírito, absolutamente alheio, por um motivo ou outro, a quem eu sou, ou a quem eu suponho que sou. Dizia-o, imediatamente, espontaneamente, como sendo de certo amigo meu, cujo nome inventava, cuja história acrescentava, e cuja figura – cara, estatuto, traje e gesto – imediatamente eu via diante de mim. E assim arranjei, e propaguei, vários amigos e conhecidos que nunca existiram, mas que ainda hoje, a perto de trinta anos de distância, ouço, sinto, vejo. Repito: ouço, sinto, vejo… E tenho saudades deles.

(Em eu começando a falar – e escrever à máquina é para mim falar -, custa-me a encontrar o travão. Basta de maçada para si, Casais Monteiro! Vou entrar na génese dos meus heterónimos literários, que é afinal, o que V. quer saber. Em todo o caso, o que vai dito acima dá-lhe a história da mãe que os deu à luz.)

Aí por 1912, salvo erro (que nunca pode ser grande), veio-me à ideia escrever uns poemas de índole pagã. Esbocei umas coisas em verso irregular (não no estilo Álvaro de Campos, mas num estilo de meia irregularidade), e abandonei o caso. Esboçara-se-me, contudo, numa penumbra mal urdida, um vago retrato da pessoa que estava a fazer aquilo. (Tinha nascido, sem que eu soubesse, o Ricardo Reis.) Ano e meio, ou dois anos depois, lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. 

Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de Março de 1914 – acerquei-me de uma cómoda alta, e tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um título, O Guardador de Rebanhos. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive. E tanto assim que, escritos que foram esses trinta e tantos poemas, imediatamente peguei noutro papel e escrevi, a fio, também, os seis poemas que constituem a Chuva Oblíqua, de Fernando Pessoa. Imediatamente e totalmente… Foi o regresso de Fernando Pessoa-Alberto Caeiro a Fernando Pessoa ele só. Ou melhor, foi a reacção de Fernando Pessoa contra a sai própria inexistência como Alberto Caeiro.

Aparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir – instintiva e subconscientemente – uns discípulos. Arranquei do seu falso paganismo o Ricardo Reis latente, descobri-lhe o nome, e ajustei-o a si mesmo, porque nessa altura já o via. E, de repente, e em derivação oposta à de Ricardo Reis, surgiu-me impetuosamente um novo individuo. Num jacto, e à máquina de escrever, sem interrupção nem emenda, surgiu a Ode Triunfal de Álvaro de Campos – a Ode com esse nome e o homem com o nome que tem.

Criei, então, uma coterie inexistente. Fixei aquilo tudo em moldes de realidade. Graduei as influências, conheci as amizades, ouvi, dentro de mim, as discussões e as divergências de critérios, e em tudo isto me parece que fui eu, criador de tudo, o menos que ali houve. Parece que tudo se passou independentemente de mim, e parece que assim ainda se passa. Se algum dia eu puder publicar a
discussão estética entre Ricardo Reis e Álvaro de Campos, verá como eles são diferentes, e como eu não sou nada na matéria.

Quando foi da publicação de Orpheu, foi preciso, à última hora, arranjar qualquer coisa para completar o número de páginas. Sugeri então ao Sá-Carneiro que eu fizesse um poema «antigo» do Álvaro de Campos – um poema de como o Álvaro de Campos seria antes de ter conhecido Caeiro e ter caído sob a sua influência. E assim fiz o Opiário, em que tentei dar todas as tendências latentes do Álvaro de Campos, conforme haviam de ser depois reveladas, mas sem haver ainda qualquer traço de contacto com o seu mestre Caeiro. Foi, dos poemas que tenho escrito, o que me deu mais que fazer, pelo duplo poder de despersonalização que tive de desenvolver. Mas, enfim, creio que não saiu mau, e que dá o Álvaro em botão…

Creio que lhe expliquei a origem dos meus heterónimos. Se há porém qualquer ponto em que precisa de um esclarecimento mais lúcido – estou escrevendo depressa, e quando escrevo depressa não sou muito lúcido - , diga, que de bom grado lho darei. E, é verdade, um complemento verdadeiro e histérico: ao escrever certos passos das Notas para recordação do meu Mestre Caeiro, do Álvaro de Campos, tenho chorado lágrimas verdadeiras. É para que saiba com quem está lidando, meu caro Casais Monteiro!

Mais uns apontamentos nesta matéria… Eu vejo diante de mim, no espaço incolor mas real do sonho, as caras, os gestos de Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Construí-lhes as idades e as vidas.

Ricardo Reis nasceu em 1887 (não me lembro do dia e do mês, mas tenho-os algures), no Porto, é médico e está presentemente no Brasil. Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu em 1915; nasceu em Lisboa mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão, nem educação quase alguma.

Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890 (às 1.30 da tarde, diz-me o Ferreira Gomes; e é verdade, pois, feito o horóscopo para essa hora, está certo). Este, como sabe, é engenheiro naval (por Glasgow), mas agora está aqui em Lisboa em inactividade. Caeiro era de estatura média, e, embora realmente frágil (morreu tuberculoso) não parecia tão frágil como era. 

Ricardo Reis é um pouco, mas muito pouco, mais baixo, mais forte, mas seco. Álvaro de Campos é alto (1,75 m de altura, mais dois cm do que eu), magro e um pouco tendente a curvar-se. Cara rapada todos – o Caeiro louro sem cor, olhos azuis; Reis de vago moreno mate; Campos, entre o branco e moreno, tipo vagamente de judeu português, cabelo, porém, liso e normalmente apartado ao lado, monóculo. Caeiro, como disse, não teve mais educação que quase nenhuma – só instrução primária; morreram-lhe cedo o pai e a mãe, e deixou-se ficar em casa, vivendo de uns pequenos rendimentos. Vivia com uma tia velha, tia-avó.

Ricardo Reis, educado num colégio de jesuítas, é, como disse, médico; vive no Brasil desde 1919, pois se expatriou espontaneamente por ser monárquico. É um latinista por educação alheia, e um semihelenista por educação própria. Álvaro de Campos teve uma educação vulgar de liceu; depois foi
mandado para a Escócia estudar engenharia, primeiro mecânica e depois naval. Numas férias fez a viagem a Oriente de onde resultou o Opiário. Ensinou-lhe latim um tio beirão que era padre.

Como escrevo em nome destes três? Caeiro, por pira e inesperada inspiração, sem saber ou sequer calcular que iria escrever. Ricardo Reis, depois de uma deliberação abstracta, que subitamente se concretiza numa ode. Campos, quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê. (O meu semi-heterónimo Bernardo Soares, que aliás em muitas coisas se parece com Álvaro de Campos, aparece sempre que estou cansado ou sonolento, de sorte que tenha um pouco suspensas as qualidades de raciocínio e de inibição; aquela prosa é um constante devaneio. É um semi-heterónimo porque, não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela. Sou eu menos o raciocínio e a afectividade. A prosa, salvo o que o raciocínio dá de ténue à minha, é igual a esta, e o português perfeitamente igual; ao passo que Caeiro escrevia mal o português, Campos razoavelmente mas com lapsos como dizer «eu próprio» em vez de «eu mesmo», etc. Reis melhor do que eu, mas com um purismo que considero exagerado. O difícil para mim é escrever a prosa de Reis – ainda inédita – ou de Campos. A simulação é mais fácil, até porque é mais espontânea em verso.)

Nesta altura estará o Casais Monteiro pensando que má sorte o fez cair, por leitura, em meio de um manicómio. Em todo o caso, o pior de tudo isto é a incoerência com que o tenho escrito. Repito, porém: escrevo como se estivesse falando consigo, para que possa escrever imediatamente. Não sendo assim, passariam meses sem eu conseguir escrever.

Falta responder à sua pergunta quanto ao ocultismo. Pergunta-me se creio no ocultismo. Feita assim, a pergunta não é bem clara; compreendo porém a intenção e a ela respondo. Creio na existência de mundos superiores ao nosso e de habitantes nesses mundos, em existências de diversos graus de espiritualidade, subtilizando-se até se chegar a um Ente Supremo, que presumivelmente criou este mundo. Pode ser que haja outros Entes, igualmente supremos, que hajam criado outros universos, e que esses universos co-existam com o nosso, interpenetradamente ou não. Por estas razões, e ainda outras, a Ordem Externa do ocultismo, ou seja a Maçonaria, evita (excepto a Maçonaria Anglo-Saxónica) a expressão «Deus», dadas as suas implicações teológicas e populares, e prefere dizer «Grande Arquitecto do Universo», expressão que deixa em branco o problema de se ele é Criador ou simplesmente Governador, do mundo. Dadas essas escalas de seres, não creio na comunicação directa com Deus, mas, segundo a nossa afinação espiritual, poderemos ir comunicando com seres cada vez mais altos. Há três caminhos para o oculto: o caminho mágico (incluindo práticas como as do espiritismo, intelectualmente ao nível da bruxaria, que é magia também), caminho esse extremamente perigoso, em todos os sentido; o caminho místico, que não tem propriamente perigos, mas é incerto e lento; e o que se chama o caminho alquímico, o mais difícil e o mais perfeito de todos, porque envolve uma transmutação da própria personalidade que a prepara, sem grandesriscos, antes com defesas que os outros caminhos não têm. Quanto a «iniciação» ou não, posso dizer-lhe só isto, que não sei se responde à sua pergunta: não pertenço a Ordem Iniciática nenhuma. A citação, epigrafe ao meu poema Eros e Psyche, de um trecho (traduzido, pois o Ritual é em latim) do Ritual do Terceiro Grau da Ordem Templária de Portugal, indica simplesmente – o que é facto – que me foi permitido folhear os Rituais dos três primeiros graus dessa Ordem, extinta, ou em dormência, desde cerca de 1888. se não estivesse em dormência, eu não citaria o trecho do ritual, pois se não devem citar (indicando a origem) trechos de Rituais que estão em trabalho.

Creio assim, meu querido Camarada, ter respondido, ainda com certa incoerência às suas perguntas. Se há outras que deseja fazer, não hesite em fazê-las. O que poderá suceder, e isso me desculpará desde já, é não responder tão depressa.

Abraça-o camarada que muito o estima e admira,

Fernando Pessoa.


P.S. (!!!)

Além da cópia que normalmente tiro para mim, quando escrevo à maquinam de qualquer carta que involve explicações da orden das que esta contém, tirei uma cópia suplementar, tanto para o caso

de esta carta se extraviar, como para o de, possivelmente, ser-ljhe precisa para qualquer outro fim. Essa cópia está sempre ás suas ordens.


Outra coisa. Pode ser que, para qualquer estudo seu, ou outro fim análogo, o Casais Monteiro precise, no futuro, de citar qualquer passo desta carta. Fica desde já autorizado a fazê-lo, mas com uma reserva, e peço-lhe licença para lha acentuar. O parágrafo sobre o ocultismo, na página 7 da minha carta, não pode ser reproduzido em letra impressa. Desejando responder o mais claramente possível à sua pergunta, saí propositadamente um pouco fora dos limites que são naturais nesta matéria. Trata-se de uma carta particular, e por isso não hesitei em fazê-lo. Nada obsta a que leia esse parágrafo a quem quiser, desde que essa outra pessoa obedeça também ao critério de não reproduzir em letra impressa o que nesse parágrafo vai escrito. Creio que posso contar consigo para tal fim negativo.

Continuo em divida para consigo da carta ultra-devida sobre os seus últimos livros. Mantenho o que creio que lhe disse na minha carta anterior: quando agora (creio que será só em Fevereiro) passar
alguns dias no Estoril, porei essa correspondência em ordem, pois estou em divida, nessa matéria, não só para consigo, mas também com várias outras pessoas.

Ocorre-me perguntar de novo uma coisa que já lhe perguntei e que me não respondeu: recebeu os meus folhetos de versos em inglês, que há tempos lhe enviei? «Para meu governo», como se diz em linguagem comercial, pedia-lhe que me indicasse o mais depressa possível que recebeu esta carta. 

Obrigado. 

F. Pessoa

sábado, 4 de abril de 2015

Tortura - Florbela Espanca

Tirar dentro do peito a Emoção,
A lúcida Verdade, o Sentimento!
 E ser, depois de vir do coração,
Um punhado de cinza esparso ao vento!

Sonhar um verso de alto pensamento,
E puro como um ritmo de oração!
– E ser, depois de vir do coração,
O pó, o nada, o sonho dum momento

São assim ocos, rudes, os meus versos:
Rimas perdidas, vendavais dispersos,
Com que eu iludo os outros, com que minto!

Quem me dera encontrar o verso puro,
O verso altivo e forte, estranho e duro,
Que dissesse, a chorar, isto que sinto!!

Florbela Espanca

quinta-feira, 5 de março de 2015

Anais Nin - Trechos

O erotismo é uma das bases do conhecimento de nós próprios, tão indispensável como a poesia.

A única anormalidade é a incapacidade de amar.

O único transformador, o único alquimista que muda tudo em ouro, é o amor.

O único antídoto contra a morte, a idade, a vida vulgar, é o amor.

A vida se contrai e se expande proporcionalmente à coragem do indivíduo.

Não vemos as coisas como são: vemos as coisas como somos.

Imaginei por um momento um mundo sem Henry.

E jurei que no dia que perder Henry, eu matarei minha vulnerabilidade, minha capacidade para o verdadeiro amor, meus sentimentos, com a devassidão mais frenética. 

Depois de Henry não quero mais amor.                           {…} 

Depois de não ver Henry por cinco dias por causa de mil obrigações, não pude suportar. Pedi a ele para se encontrar comigo durante uma hora entre dois compromissos. Conversamos por um momento, então fomos para um quarto do hotel mais próximo. Que necessidade profunda dele. Só quando estou em seus braços as coisas parecem direitas. 

Depois de uma hora com ele, pude continuar o meu dia, fazendo coisas que não quero fazer, vendo pessoas que não me interessam.

quarta-feira, 4 de março de 2015

E assim que te quero amor - Pablo Neruda

É assim que te quero, amor,
assim, amor, é que eu gosto de ti,
tal como te vestes
e como arranjas
os cabelos e como
a tua boca sorri,
ágil como a água
da fonte sobre as pedras puras,
é assim que te quero, amada,
Ao pão não peço que me ensine,
mas antes que não me falte
em cada dia que passa.

Da luz nada sei, nem donde
vem nem para onde vai,
apenas quero que a luz alumie,
e também não peço à noite explicações,
espero-a e envolve-me,
e assim tu pão e luz
e sombra és.
Chegastes à minha vida
com o que trazias,
feita
de luz e pão e sombra, eu te esperava,
e é assim que preciso de ti,
assim que te amo,
e os que amanhã quiserem ouvir
o que não lhes direi, que o leiam aqui
e retrocedam hoje porque é cedo
para tais argumentos.
Amanhã dar-lhes-emos apenas
uma folha da árvore do nosso amor, uma folha
que há-de cair sobre a terra
como se a tivessem produzido os nosso lábios,
como um beijo caído
das nossas alturas invencíveis
para mostrar o fogo e a ternura
de um amor verdadeiro.

Pablo Neruda

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Lembro-me bem do seu olhar - Jose L. Peixoto

Lembro-me bem do seu olhar.
Ele atravessa ainda a minha alma,
Como um risco de fogo na noite.

Lembro-me bem do seu olhar. 

O resto…
Sim o resto parece-se apenas com a vida.

Ontem, passei nas ruas como qualquer pessoa.

Olhei para as montras despreocupadamente e não encontrei amigos com quem falar.

De repente vi que estava triste, mortalmente triste, tão triste que me pareceu que me seria impossível viver amanhã, não porque morresse ou me matasse, mas porque seria impossível viver amanhã e mais nada.

Fumo, sonho, recostado na poltrona.
Dói-me viver como uma posição incómoda.

Deve haver ilhas lá para o sul das coisas onde sofrer seja uma coisa mais suave, onde viver custe menos ao pensamento, e onde a gente possa fechar os olhos e adormecer ao sol e acordar sem ter que pensar em responsabilidades sociais nem no dia do mês ou da semana que é hoje.

Abrigo no peito, como a um inimigo que temo ofender, um coração exageradamente espontâneo, que sente tudo o que eu sonho como se fosse real, que bate com o pé a melodia das canções que o meu pensamento canta, canções tristes, como as ruas estreitas quando chove

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Nunca te beijei - Florbela Espanca


Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer !
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder ...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer !

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda ...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz !

Amo-te tanto ! E nunca te beijei ...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

Florbela Espanca
Filme Casablanca

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Quarto em Desordem - Carlos Drummond

Na curva perigosa dos cinquenta derrapei neste amor.

Que dor! que pétala sensível e secreta me atormenta e me provoca à síntese da flor que não sabe como é feita: amor na quinta-essência da palavra, e mudo de natural silêncio já não cabe em tanto gesto de colher e amar 

A nuvem que de ambígua se dilui nesse objeto mais vago do que nuvem e mais indefeso, corpo! 
Corpo, corpo, corpo 

Verdade tão final, sede tão vária a esse cavalo solto pela cama a passear o peito de quem ama.


Poesia de Carlos Drummond
Quadro Vincent Van Gogh 

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

A Outra - Fernando Pessoa

Amamos sempre no que temos
O que não temos quando amamos.
O barco pára, largo os remos
E, um a outro, as mãos nos damos.
A quem dou as mãos?
À Outra.

Teus beijos são de mel de boca, são os que sempre pensei dar, e agora e minha boca toca a boca que eu sonhei beijar. De quem é a boca?
Da Outra.

Os remos já caíram na água, o barco faz o que a água quer. Meus braços vingam minha mágoa no abraço que enfim podem ter.
Quem abraço?
A Outra.

Bem sei, és bela, és quem desejei não deixe a vida que eu deseje mais que o que pode ser teu beijo e poder ser eu que te beije.
Beijo, e em quem penso?
Na Outra.

Os remos vão perdidos já, o barco vai não sei para onde. Que fresco o teu sorriso está, ah, meu amor, e o que ele esconde!
Que é do sorriso
Da Outra?

Ah, talvez, mortos ambos nós,num outro rio sem lugar em outro barco outra vez sós possamos nos recomeçar que talvez sejas
A Outra.

Mas não, nem onde essa paisagem é sob eterna luz eterna te acharei mais que alguém na viagem que amei com ansiedade terna por ser parecida com a Outra.

Ah, por ora, idos remo e rumo, dá-me as mãos, a boca, o ter ser. Façamos desta hora um resumo do que não poderemos ter.

Nesta hora, a única, sê a Outra.

Fernando Pessoa

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Murmúrio - Cecilia Meireles

Traze-me um pouco das sombras serenas que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas, vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares que a noite sustenta no seu coração!

A alvura, apenas, dos ares:
vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança,
aroma perdido, saudade da flor!

Vê que nem te digo — esperança!
Vê que nem sequer sonho — amor!


Cecilia Meireles

domingo, 12 de outubro de 2014

Livro do desassossego - Trechos - Fernando Pessoa

"O coração, se pudesse pensar, pararia."


"Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo. Não sei onde me levará, porque não sei nada. 


Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela; poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros. 

Não sou, porém, nem impaciente nem comum. Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono; deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cômodas até mim. 

Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero.

Para todos nós descerá a noite e chegará a diligência. Gozo a brisa que me dão e a alma que me deram para gozá-la, e não interrogo mais nem procuro. Se o que deixar escrito no livro dos viajantes puder, relido um dia por outros, entretê-los também na passagem, será bem. Se não o lerem, nem se entretiverem, será bem também."
...

"Escrevo, triste, no meu quarto quieto, sozinho como sempre tenho sido, sozinho como sempre serei. E penso se a minha voz, aparentemente tão pouca coisa, não encarna a substância de milhares de vozes, a fome de dizerem-se de milhares de vidas, a paciência de milhões de almas submissas como a minha ao destino quotidiano, ao sonho inútil, à esperança sem vestígios. 

Nestes momentos meu coração pulsa mais alto por minha consciência dele. Vivo mais porque vivo maior.
"É domingo e não tenho que fazer. Nem sonhar me apetece, de tão bem que está o dia. Gozo-o com uma sinceridade de sentidos a que a inteligência se abandona. Passeio como um caixeiro liberto. Sinto-me velho, só para ter o prazer de me sentir rejuvenescer."
...

"O homem perfeito do pagão era a perfeição do homem que há; o homem perfeito do cristão a perfeição do homem que não há; o homem perfeito do budista a perfeição de não haver homem."
...

"Tudo quanto o homem expõe ou exprime é uma nota à margem de um texto apagado de todo. Mais ou menos, pelo sentido da nota, tiramos o sentido de que havia de ser o do texto; mas fica sempre uma dúvida, e os sentidos possíveis são muitos."
...

"Não é fácil distinguir o homem dos animais, não há critério seguro para distinguir o homem dos animais. As vidas humanas decorrem da mesma íntima inconsciência que as vidas dos animais. As mesmas leis profundas, que regem de fora os instintos dos animais, regem, também, de fora, a inteligência do homem, que parece não ser mais que um instinto em formação, tão inconsciente como todo instinto, menos perfeito porque ainda não formado.

Fernando Pessoa como Bernardo Soares
Imagens de um cartaz sobre um curso sobre o livro e a capa do mesmo.
O Livro do Desassossego é uma das obras maiores de Fernando Pessoa. É assinado pelo semi-heterônimo Bernardo Soares. É um livro fragmentário, tendo interpretações díspares sobre o modo de organizar o livro.Teresa Sobral Cunha considera que existem dois Livros do Desassossego. Segundo a estudiosa, que organizou em conjunto com Jacinto do Prado Coelho e Maria Aliete Galhoz a primeira edição do livro editada apenas em 1982, existem dois autores do livro: Vicente Guedes numa primeira fase (anos 10 e 20) e o já referido Bernardo Soares (final dos anos 20 e 30).
Já António Quadros considera que a primeira fase do livro pertence a Pessoa. A segunda fase, mais pessoal e de índole da escrita de um diário, é a que pertence a Bernardo Soares.

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Me alegra poder pensar, sentir 

e encontrar eco nas palavras de Fernando Pessoa.

O desassossego faz parte da vida de todos nós...
e como uma ventania devemos saber que ela passa e se vai.

Segue o link :

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